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quarta-feira, 23 de abril de 2014
HIPOCRISIA MIDIÁTICA
O sujeito atira para matar, as câmeras mostram tudo ao vivo, e os jornais, revistas, rádios etc. o chamam de 'suspeito'. Criminoso não, bandido não, é suspeito. Ao mesmo tempo em que alguém vai para uma manifestação qualquer, quebra uma coisa qualquer e, mesmo sem saber de quem se trata e de por que quebrou, a mídia o chama de vândalo. Acho esse comportamento muito suspeito.
quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014
A IMAGEM INTOLERÁVEL
"É preciso pôr em causa a opinião corrente segundo a qual esse sistema nos submerge numa vaga de imagens em geral - e imagens de horror em particular -, tornando-nos assim insensíveis à realidade banalizada desses horrores. Essa opinião é amplamente aceita porque confirma a tese tradicional de que o mal das imagens está em seu número, na profusão que invade sem possibilidade de defesa o olhar fascinado e o cérebro amolecido da multidão de consumidores democráticos de mercadorias e imagens. Essa visão pretende ser crítica, mas está perfeitamente de acordo com o funcionamento do sistema. Pois os meios de comunicação dominantes não nos afogam de modo algum sob a torrente de imagens que dão testemunho de massacres, fugas em massa e outros horrores que constituem o presente de nosso planeta. Bem ao contrário, eles reduzem o seu número, tomam bastante cuidado para selecioná-las e ordená-las. Eliminam tudo o que possa exceder a simples ilustração redundante de sua significação. O que vemos, sobretudo nas telas de informação de televisão, é o rosto de governantes, especialistas e jornalistas a comentarem as imagens, a dizerem o que elas mostram e o o que devemos pensar a respeito. Se o horror está banalizado, não é porque vemos imagens demais. Não vemos corpos demais a sofrerem na tela. Mas vemos corpos demais sem nome, corpos demais incapazes de nos devolver o olhar que lhes dirigimos, corpos que são objeto de palavra sem terem a palavra. O sistema de Informação não funciona pelo excesso de imagens, funciona selecionando seres que falam e raciocinam, que são capazes de 'descriptar' a vaga de informações referentes às multidões anônimas. A política dessas imagens consiste em nos ensinar que não é qualquer um que é capaz de ver e falar. E essa lição é confirmada de maneira prosaica pelos que pretendem criticar a inundação das imagens pela televisão."
Jacques Rancière
O ESPECTADOR EMANCIPADO
[A imagem intolerável]
terça-feira, 5 de abril de 2011
CRIATIVIDADE É UMA PEDRA RARA QUE BRILHA AOS OLHOS DE POUCOS. QUE NEM O CLICHÊ
Um vídeo curto [e grosso] para divertir. Dica de Cesar Passos Gomes.
quinta-feira, 3 de março de 2011
OS LIVROS E AS COISAS EM 1947
Este documentário de 1947 explica como os livros eram feitos na época, considerando gráfica, sistemas de impressão, maquinário, etc. Mas ele também explica como os próprios documentários eram feitos. E como as pessoas daquele tempo se vestiam. E como se fazia a divisão do trabalho entre os sexos. E como a indústria confundia os homens com as máquinas. E muito mais.
Seja qual for o seu interesse – melhor ainda se for por mera curiosidade –, assista-o!
Ps.: Acabei de perceber uma coisa: repare na semelhança desse documentário com o filme Tempos Modernos, de Charlie Chaplin. Legal, né?
sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
IT'S CHRISTMAS TIME!
Era o programa favorito do país. Depois que descobriram a verdadeira vocação do Papai Noel, seu índice de celebridade bateu no teto e ele foi parar na TV. Era o apresentador mais simpático da telinha e... dava presentes! O IBOPE, das 14h às 23h de domingo, era exclusividade sua. Bons tempos. Eu adorava o quadro "Renas da Fortuna", embora os mais populares fossem a "Porta do Pólo Norte" e as "Cartas ao Vento". Meu sonho era estar naquela plateia, na caravana da minha cidade, para sorrir e cantar com o bom velhinho. Lá, lá, lalá. Lá, lá, lalá. Era o sonho de muita gente, embora nem mesmo o Papai Noel pudesse realizar todos. Então, um dia, descobriram a farsa. Papai Noel tinha outra identidade, era um inescrupuloso homem de negócios, escondido sob a barba, a roupa vermelha e o microfone de lapela. Foi quando deixei de acreditar nele.
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
MORTE E VIDA SEVERINA, O FILME
Ótima notícia para quem tem curiosidade de conhecer um clássico da literatura brasileira mas ainda vive o trauma causado pelo nosso sistema de ensino, que desestimula até os estudantes mais interessados.
A animação Morte e Vida Severina, inspirada no livro homônimo de João Cabral de Melo Neto, é um projeto da TV Escola/Fundação Joaquim Nabuco e tem produção da OZI Escola de Audiovisual de Brasília.
O filme é uma adaptação dos quadrinhos de Miguel Falcão e terá 50 minutos. A estreia está marcada para janeiro de 2011, na TV Escola. Por enquanto, temos que nos contentar com o trailer acima, mas já dá para perceber da riqueza da produção. Tomara que a ideia pegue e que logo venham outros.
quarta-feira, 10 de novembro de 2010
A VOZ DO JAZZ ÀS GARGALHADAS
Quem gosta de jazz vive falando dos diálogos e improvisos entre os instrumentos, da sintonia com o cotidiano, da verdadeira voz da música, etc. Quem não gosta se faz de desinteressado, considera aquilo tudo invencionice de gente aficcionada, parece tão chato de ouvir quanto de argumentar a respeito.
Nesta cena maravilhosa, o humorista americano Jerry Lewis mostra que o jazz e a vida têm muito em comum. Tudo bem, falo como fã do estilo. Se você também é, assista, vai ser divertido. Se você não é, assista também. Tenho certeza de que os nossos blá blá blás passarão a fazer muito mais sentido.
Jerry Lewis - O garoto dos recados (1961)
Nesta cena maravilhosa, o humorista americano Jerry Lewis mostra que o jazz e a vida têm muito em comum. Tudo bem, falo como fã do estilo. Se você também é, assista, vai ser divertido. Se você não é, assista também. Tenho certeza de que os nossos blá blá blás passarão a fazer muito mais sentido.
Jerry Lewis - O garoto dos recados (1961)
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
VISÃO PARCIAL DO MUNDO
Somos escravos das cores e o preço da liberdade é alto demais. As cores dão sentido ao mundo, é verdade. Mas também é verdade que dão um sentido só: aquele que se vê com os próprios olhos e prevalece como verdade. Os outros sentidos, que podem ser ouvidos, tocados, cheirados, provados ou intuídos são menosprezados, não recebem a credibilidade e a atenção que merecem. É o que mostra o filme Vermelho como o céu, produção italiana que recebeu o Prêmio do Público da 30ª Mostra de Cinema de São Paulo (2006) e que foi exibido recentemente no programa Mostra Internacional de Cinema, da TV Cultura.
A história trata de um menino que perde a visão em um acidente e é enviado a uma escola para cegos. Sua sina é cruel: deve aprender a perceber o mundo por meio dos outros sentidos que lhe restam.
Em um de seus momentos mais sensíveis, o protagonista tenta explicar a experiência das cores a um colega, cego de nascença. "O azul? É como o vento que toca o rosto quando a gente anda de bicicleta. O marrom é rugoso como a casca de uma árvore. O vermelho é quente como o fogo, como o céu ao pôr-do-sol".
Assisti àquilo e tentei me colocar em seu lugar. Como eu explicaria as cores, como poderia traduzi-las em outros sentidos?
Percebi que, mesmo lidando com elas há décadas, mal consigo descrevê-las sem recorrer a referências visuais.
Talvez meus outros sentidos estejam cegos para o mundo. Talvez eu não saiba o que as cores são de verdade. Talvez eu saiba apenas o que elas parecem ser. Não há profundidade, não há sentimento. Minhas cores são superficiais. Minha apreensão das coisas é parcial.
O filme Vermelho como o céu me mostrou que sou cego e não sabia.
A história trata de um menino que perde a visão em um acidente e é enviado a uma escola para cegos. Sua sina é cruel: deve aprender a perceber o mundo por meio dos outros sentidos que lhe restam.
Em um de seus momentos mais sensíveis, o protagonista tenta explicar a experiência das cores a um colega, cego de nascença. "O azul? É como o vento que toca o rosto quando a gente anda de bicicleta. O marrom é rugoso como a casca de uma árvore. O vermelho é quente como o fogo, como o céu ao pôr-do-sol".
Assisti àquilo e tentei me colocar em seu lugar. Como eu explicaria as cores, como poderia traduzi-las em outros sentidos?
Percebi que, mesmo lidando com elas há décadas, mal consigo descrevê-las sem recorrer a referências visuais.
Talvez meus outros sentidos estejam cegos para o mundo. Talvez eu não saiba o que as cores são de verdade. Talvez eu saiba apenas o que elas parecem ser. Não há profundidade, não há sentimento. Minhas cores são superficiais. Minha apreensão das coisas é parcial.
O filme Vermelho como o céu me mostrou que sou cego e não sabia.
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
A CRÍTICA DA CRÍTICA
Os Simpsons são famosos pela crítica social que fazem por meio de sátiras e exageros, transformando assuntos sérios em piadas. Muitos outros seriados fazem o mesmo e também têm audiência relevante tanto nos Estados Unidos quanto no resto do mundo, vide South Park e Family Guy. Aliás, criticar a sociedade norte-americana rende tanto assunto que Os Simpsons, por exemplo, já estão no ar há mais de vinte anos. Todo mundo adora, inclusive os próprios criticados, que fazem questão de ser o assunto da vez. E, até onde podemos constatar, o resultado dessa crítica é nulo - salvo as risadas.
No vídeo acima, vemos uma cena inusitada. Banksy, artista de rua bastante conhecido por desenvolver obras de apelo social, foi convidado para reinventar a abertura clássica de Os Simpsons. A polêmica foi tamanha que a Fox tentou abafar o caso (eles não devem ter achado a menor graça). Adivinhe o que aconteceu: o mesmo que sempre acontece quando uma empresa desse porte, preferencialmente americana, tenta abafar um caso: mais gente ficou sabendo.
O minuto e meio que Banksy criou deve ter gerado muito mais reflexão do que toda a década de exibição do seriado. Por quê? Provavelmente porque ele fez uma crítica consistente daqueles que eram famosos por criticar os outros. E utilizando o próprio programa.
Também acredito que haja um motivo ainda mais forte: Banksy mostrou que, por trás da piada, sempre existe um assunto sério - sabe aquele ditado segundo o qual toda piada tem um fundo de verdade? No caso, trata-se de um assunto do qual costumamos rir, ignorar e esquecer, colocado em evidência onde menos se esperava. Dá mesmo o que falar.
Parabéns a Os Simpson por permitir uma manifestação tão bacana.
Saiba mais sobre o artista: Banksy
terça-feira, 6 de abril de 2010
"Se me permite, Majestade, há mais indícios a examinar", disse o Coelho Branco, muito afobado, dando um pulo para a frente: "Este documento acaba de ser apreendido".
"O que há nele?", indagou a Rainha.
"Ainda não o abri", respondeu o Coelho Branco, "mas parece ser uma carta, escrita pelo prisioneiro para... para alguém."
"Disso não há dúvida", disse o Rei, "a menos que tivesse sido escrita para ninguém, o que não é comum, como sabe."
"A quem está endereçada?", inquiriu um dos jurados.
"Simplesmente não está endereçada", disse o Coelho Branco; "de fato, não há nada escrito do lado de fora." Desdobrou o papel enquanto falava, e acrescentou: "Afinal de contas, não é uma carta. É um conjunto de versos."
"Estão escritos com a letra do prisioneiro?", perguntou outro dos jurados.
"Não, não estão", diss o Coelho Branco, "e isso é o que têm de mais esquisito." (Todo o júri parecia pasmo.)
"Ele deve ter imitado a letra de outra pessoa", disse o Rei. (Todo o júri se iluminou de novo.)
"Por favor, Majestade", apelou o Valete, "não escrevi isso e não podem provar que escrevi: não há nenhuma assinatura no fim."
"Se você não assinou isso", disse o Rei, "as coisas só pioram. Só podia ter má intenção, ou teria assinado, como um homem de bem."
A isto se seguiram aplausos gerais: era a primeira coisa realmente sagaz que o Rei dissera aquele dia.
"Isso prova a culpa dele", disse a Rainha.
Trecho de Aventuras de Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll
quinta-feira, 23 de abril de 2009
NÃO É VERDADE
Citar casos que envolvem o dia-a-dia de muitas pessoas é uma atitude que sempre tende a polemizar. Esta crônica tem um pouco disso – fala da novela “das oito”, momento sagrado da TV brasileira e também da vida de todas as classes sociais.
Antes de tudo, gostaria de deixar claro que minha intenção não é provocar o leitor gratuitamente. Usei o exemplo da novela, entre outros, justamente por causa da enorme influência que ela exerce sobre nós. Peço, portanto, que não o encare como nada pessoal, mas que perceba como o assunto está próximo, ainda que, muitas vezes, passe despercebido.
Decidi escrever esta crônica quando comecei a ouvir comentários absurdos sobre o país, a cultura e o povo indianos. Coisas como “lá tudo é lindo”, “as tradições não se perderam com o tempo” e “os indianos é que são felizes”. Sinceramente, fiquei preocupado com tamanha convicção. O ápice foi ver gente querendo passear lá achando que visitaria o paraíso.
Enfim, se você quiser pesquisar um pouco mais, sugiro que acesse o site www.youtube.com e faça uma busca utilizando palavras como “Índia”, “imagem” e “novela”, ou frases como “cenas que não aparecem na novela” e “imagens que a novela não mostra”. Existe também um documentário produzido pela BBC e disponibilizado em bancas de jornais pela editora Abril (2 DVDs) que pode ser outra boa fonte de informação.
Esta crônica não é, necessariamente, verdade. Nem tudo que está escrito é verdade. Nem sempre os livros, jornais e revistas estão 100% corretos. Sabe por quê? Não existe verdade única e absoluta, apenas versões pessoais. Apenas facetas da verdade. O mesmo vale para a TV. Ela mente o tempo todo. Escolhe bem as palavras, muda a ordem de alguns fatores e muitas vezes omite outros só para manter você ligadão nela. Também inventa mil e uma histórias e chama isso de ficção. Então, o que devemos fazer? Parar de ler e de assistir TV? Não, claro que não. Devemos buscar uma coisinha importante que falta na vida de muita gente: discernimento.
O tal discernimento nada mais é do que a capacidade de analisar e saber distinguir a realidade da ficção, assim como os interesses tendenciosos dos fatos. Infelizmente, discernimento ainda não é vendido em supermercados; é adquirido somente com a experiência e com a busca de conhecimento.
Parece bastante chato, mas não é não. Descobrir coisas novas é divertido, pergunte às crianças. Você também já foi uma delas. Sabe quando perdeu o interesse pelo novo? Quando colocou na cabeça que já sabia o suficiente para ser um “adulto maduro”, sem necessidade de aprender mais. Fecharam-se as portas da sabedoria e escancararam-se as da ignorância.
Lembra quando O código Da Vinci chegou às livrarias e logo se tornou best seller absoluto? Pois eu me lembro também da subsequente confusão com o Vaticano, que viu seus valores feridos pelo livro. Ora, o problema não foi o autor, Dan Brown, ter inventado conspirações, assassinatos e dito algumas coisas de maneira diferente de como elas costumam ser ditas, afinal, quantos já não fizeram isso antes? O motivo de tanto incômodo é que a mentira foi tão bem contada que muita gente acreditou, criticando a igreja, exigindo explicações, retaliações etc. Resultado: Dan Brown teve que explicar em praça pública que seu romance era apenas isso mesmo, um romance, uma ficção, uma história inventada – ninguém precisava se ofender. Acredite se quiser: é a uma situação absurda como esta que a falta de discernimento nos leva.
Isso porque estamos falando de literatura, que pressupõe um público mais culto e que, no Brasil, toma goleada de outras fontes de informação mais massivas, como a TV, por exemplo. A propósito, gostaria de citar o caso da novela Caminho das Índias, que tem feito um baita sucesso e que, por outro lado, tem me incomodado bastante. Admito que se trata de uma ficção e que isso lhe dá o direito de inventar de tudo, mas ela mostra um país tão diferente da realidade que acaba por enganar todos que sofrem de falta de discernimento (e de conhecimento). Nesse sentido, sabendo da força que exerce perante a população, acho uma tremenda falta de responsabilidade da Globo transmitir uma novela dessas sem produzir em paralelo programas educativos que mostrem a Índia além da ficção. Quem se interessar e quiser fazer um contraponto, sugiro que veja o filme que foi o grande destaque do último Oscar: Quem quer ser um milionário?
Quer dizer que o filme é mais verdadeiro que a novela? Não, obviamente. Trata-se apenas de outra faceta da verdade e pode ajudar bastante a ampliar seu conhecimento sobre o assunto.
Já dizia Napoleão (acho que era ele): “A história é uma versão do passado na qual todos decidimos acreditar”. Parodiando o antigo imperador, digo eu: “Uma coisa só se torna verdade no momento em que todos decidimos acreditar nela”. Portanto, vamos procurar saber um pouco mais antes de sair por aí acreditando em tudo o que os outros dizem.
No quarto volume de O método, Edgar Morin escreve: “(...) insisto em observar que todo conhecimento filosófico, científico ou poético emerge da vida cultural comum. (...) O conhecimento cotidiano é uma mistura singular de percepções sensoriais e de construções ideoculturais, de racionalidades e de racionalizações, de intuições verdadeiras e falsas, de induções justificadas e errôneas, de silogismos e de paralogismos, de ideias recebidas e de ideias inventadas, de saberes profundos, de sabedorias ancestrais de fontes misteriosas e de superstições infundadas, de crenças inculcadas e de opiniões pessoais”.
Daí, concluo que pesquisar, refletir e debater são hábitos bastante saudáveis. Caso contrário, corremos o sério risco de acabar fiéis a um monte de bobagens. E de viver no mundo do faz-de-conta, onde tanto sábios quanto bobos são apenas personagens de uma entidade manipuladora muito mais poderosa: o contador de histórias.
Antes de tudo, gostaria de deixar claro que minha intenção não é provocar o leitor gratuitamente. Usei o exemplo da novela, entre outros, justamente por causa da enorme influência que ela exerce sobre nós. Peço, portanto, que não o encare como nada pessoal, mas que perceba como o assunto está próximo, ainda que, muitas vezes, passe despercebido.
Decidi escrever esta crônica quando comecei a ouvir comentários absurdos sobre o país, a cultura e o povo indianos. Coisas como “lá tudo é lindo”, “as tradições não se perderam com o tempo” e “os indianos é que são felizes”. Sinceramente, fiquei preocupado com tamanha convicção. O ápice foi ver gente querendo passear lá achando que visitaria o paraíso.
Enfim, se você quiser pesquisar um pouco mais, sugiro que acesse o site www.youtube.com e faça uma busca utilizando palavras como “Índia”, “imagem” e “novela”, ou frases como “cenas que não aparecem na novela” e “imagens que a novela não mostra”. Existe também um documentário produzido pela BBC e disponibilizado em bancas de jornais pela editora Abril (2 DVDs) que pode ser outra boa fonte de informação.
Esta crônica não é, necessariamente, verdade. Nem tudo que está escrito é verdade. Nem sempre os livros, jornais e revistas estão 100% corretos. Sabe por quê? Não existe verdade única e absoluta, apenas versões pessoais. Apenas facetas da verdade. O mesmo vale para a TV. Ela mente o tempo todo. Escolhe bem as palavras, muda a ordem de alguns fatores e muitas vezes omite outros só para manter você ligadão nela. Também inventa mil e uma histórias e chama isso de ficção. Então, o que devemos fazer? Parar de ler e de assistir TV? Não, claro que não. Devemos buscar uma coisinha importante que falta na vida de muita gente: discernimento.
O tal discernimento nada mais é do que a capacidade de analisar e saber distinguir a realidade da ficção, assim como os interesses tendenciosos dos fatos. Infelizmente, discernimento ainda não é vendido em supermercados; é adquirido somente com a experiência e com a busca de conhecimento.
Parece bastante chato, mas não é não. Descobrir coisas novas é divertido, pergunte às crianças. Você também já foi uma delas. Sabe quando perdeu o interesse pelo novo? Quando colocou na cabeça que já sabia o suficiente para ser um “adulto maduro”, sem necessidade de aprender mais. Fecharam-se as portas da sabedoria e escancararam-se as da ignorância.
Lembra quando O código Da Vinci chegou às livrarias e logo se tornou best seller absoluto? Pois eu me lembro também da subsequente confusão com o Vaticano, que viu seus valores feridos pelo livro. Ora, o problema não foi o autor, Dan Brown, ter inventado conspirações, assassinatos e dito algumas coisas de maneira diferente de como elas costumam ser ditas, afinal, quantos já não fizeram isso antes? O motivo de tanto incômodo é que a mentira foi tão bem contada que muita gente acreditou, criticando a igreja, exigindo explicações, retaliações etc. Resultado: Dan Brown teve que explicar em praça pública que seu romance era apenas isso mesmo, um romance, uma ficção, uma história inventada – ninguém precisava se ofender. Acredite se quiser: é a uma situação absurda como esta que a falta de discernimento nos leva.
Isso porque estamos falando de literatura, que pressupõe um público mais culto e que, no Brasil, toma goleada de outras fontes de informação mais massivas, como a TV, por exemplo. A propósito, gostaria de citar o caso da novela Caminho das Índias, que tem feito um baita sucesso e que, por outro lado, tem me incomodado bastante. Admito que se trata de uma ficção e que isso lhe dá o direito de inventar de tudo, mas ela mostra um país tão diferente da realidade que acaba por enganar todos que sofrem de falta de discernimento (e de conhecimento). Nesse sentido, sabendo da força que exerce perante a população, acho uma tremenda falta de responsabilidade da Globo transmitir uma novela dessas sem produzir em paralelo programas educativos que mostrem a Índia além da ficção. Quem se interessar e quiser fazer um contraponto, sugiro que veja o filme que foi o grande destaque do último Oscar: Quem quer ser um milionário?
Quer dizer que o filme é mais verdadeiro que a novela? Não, obviamente. Trata-se apenas de outra faceta da verdade e pode ajudar bastante a ampliar seu conhecimento sobre o assunto.
Já dizia Napoleão (acho que era ele): “A história é uma versão do passado na qual todos decidimos acreditar”. Parodiando o antigo imperador, digo eu: “Uma coisa só se torna verdade no momento em que todos decidimos acreditar nela”. Portanto, vamos procurar saber um pouco mais antes de sair por aí acreditando em tudo o que os outros dizem.
No quarto volume de O método, Edgar Morin escreve: “(...) insisto em observar que todo conhecimento filosófico, científico ou poético emerge da vida cultural comum. (...) O conhecimento cotidiano é uma mistura singular de percepções sensoriais e de construções ideoculturais, de racionalidades e de racionalizações, de intuições verdadeiras e falsas, de induções justificadas e errôneas, de silogismos e de paralogismos, de ideias recebidas e de ideias inventadas, de saberes profundos, de sabedorias ancestrais de fontes misteriosas e de superstições infundadas, de crenças inculcadas e de opiniões pessoais”.
Daí, concluo que pesquisar, refletir e debater são hábitos bastante saudáveis. Caso contrário, corremos o sério risco de acabar fiéis a um monte de bobagens. E de viver no mundo do faz-de-conta, onde tanto sábios quanto bobos são apenas personagens de uma entidade manipuladora muito mais poderosa: o contador de histórias.
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