Ainda no colégio, tive uma paixonite por uma garota que, se muito, foi amiga minha durante um período breve. A história se resumiria a isso caso eu não tivesse descoberto – anos mais tarde e meses após o ocorrido – que ela falecera num acidente de carro. Tinha o quê?, dezoito, dezenove anos? Foi ela que fez da morte algo factível. Quer dizer, que me apresentou a possibilidade de morte para jovens da minha idade e, no limite, para mim mesmo. Até então, morrer era uma verdade distante. Não pertencia à minha realidade.
O namorado dirigia. Pegaram um caminhão de frente na estrada. Disseram que foi ultrapassagem em local proibido. Para ser sincero, nunca quis saber se foi mesmo. Não queria explicação. Pensei em culpar o namorado, já pensei em culpá-la por namorá-lo, só que isso não leva a nada, exceto a mais arrependimento por nunca ter levado a cabo minha vontade e, com sorte, modificado sua trajetória. Bom, talvez não dependesse de mim. Éramos crianças. E essa culpa só vem acompanhada de remorso. Ninguém precisa dela.
Ainda hoje sinto que Ingrid está viva. De vez em quando, com intervalos de tempo sempre mais longos, me percebo lembrando dela, do seu perfil esguio, sua postura ereta de bailarina. Aos poucos, sua imagem vai desaparecendo. Era uma garota bonita, embora sorrisse pouco. Sempre lhe desejei um futuro próspero. Eu queria vê-la dançar, coisa que fazia tão bem. Dançar num palco grandioso. E ver a plateia aplaudi-la de pé.
Sim, penso nela de vez em quando. É como se estivesse dançando por aí, em algum teatro da cidade. Um lugar próximo de mim. Como se a notícia não tivesse passado de um mal entendido. Como se não houvesse nada com que se preocupar. Bastaria isso. Um desencontro. Um desencontro de informações. Um encontro, talvez. Bastaria.