O tempo me escapa. Mais ou menos como se eu pusesse as mãos sob uma torneira e o tempo escorresse por ela. Escapa por entre os dedos, corre pelas frestas, não importa como eu tente contê-lo. Desajeitadamente. O tempo corre, escorre, escoa sem penetrar. Sem deixar vestígio.
Sinto-me ausente. Como se não pertencesse, como se não estivesse a par do aqui e agora. Inconsciente.
Passou, eu não vi. Foi pelo ralo, foi pelos ares. A ansiedade do início desembocou num desencontro. Sozinho. Na fossa. Suspiro. O último. Quando me dei conta, já tinha ido. Tinha acontecido. Pelas minhas costas, um golpe de vento, um arrepio, um piscar de olhos. A corrente levou. Onde eu estava?
Onde eu estava com a cabeça?
Lá se foi, uma vez mais, como sempre.
Ser sem estar, estar sem ser, não sei dizer.
Sinto. Muito.
É mesmo uma coisa sem sentido.
Por enquanto.
Agora e sempre. Aqui e afora.
O que aconteceria se eu fechasse a torneira? Se voltasse pelo cano, se explorasse a rede oculta nas paredes? Sumir também. Estar contido. Contente. Existe um submundo que percorre o edifício todo, a cidade inteira em conexão. Tudo corre, escorre, escoa.
Sem ver ou ser visto.
Desenhar um mapa no papel. Em branco. Fazendo. Criando. Existindo.
E eu incomodado com as gotas de água que me tocam sem molhar. A água que não me pertence. Que passa à toa. Que trans–borda.
Para além da fronteira do bem e do mal.