Tive o prazer de acompanhar o desenvolvimento artístico de Felipe Góes desde suas primeiras explorações do campo da cor até as pinturas mais recentes que foram trazidas para esta exposição. Pois daqueles campos floresceram paisagens que se põem no limiar entre o figurativo e o abstrato, entre a racionalidade do dia e o sonho difuso, entre as certezas do momento presente e o vago sentimento da memória. Pintar, no século XXI, pressupõe lidar com pensamentos contemporâneos, entre os quais está a relação com o espectador – uma vez que as interpretações deste se tornam parte integrante da obra, a despeito das intenções do artista.
A pintura de Felipe envolve o olhar e clama por nossa participação. Entramos na tela, caminhamos por territórios pictóricos e sensíveis que, de uma hora para outra, se revelam partes constitutivas de nossos corpos e mentes. Uma revelação de mão dupla: a obra em nós e nós na obra.
Imagens que vêm e vão, construções que fazem e se desfazem. Aquela mancha de tinta que exprime um significado, traduz um sentimento, aviva uma lembrança para, em seguida, afundar novamente nas brumas.
Os olhos nos enganam. Pois nossa apreensão do mundo se dá por cores e formas atreladas a significados, ou seja, pela decodificação de estímulos visuais. Uma mancha que se transforma em barco, outra que lembra uma praia com palmeiras. É assim, através da percepção, e da persistência do real para fazer-se e manter-se, que vamos inventando tudo ao nosso redor, produzindo verdades ambíguas.
Ver, lembrar, desvendar e somar são formas de criação contidas em nossa subjetividade. Por se relacionar diretamente com o passado que cada pessoa carrega consigo, a pintura de Felipe Góes é capaz de despertar imagens esquecidas, emoções há muito tempo escondidas, desejos reprimidos. Tudo isso com manchas de tinta sobre tela. Enchendo de cor os contornos sinuosos da memória.
As imagens se referem, na ordem: 1) Pintura 104 (2010); 2) Pintura 105 (2010); 3) Pintura 106 (2010); 4) Pintura 108 (2011); 5) Pintura 130 (2011); 6) Pintura 136 (2011); 7) Pintura 138 (2011).