Somos escravos das cores e o preço da liberdade é alto demais. As cores dão sentido ao mundo, é verdade. Mas também é verdade que dão um sentido só: aquele que se vê com os próprios olhos e prevalece como verdade. Os outros sentidos, que podem ser ouvidos, tocados, cheirados, provados ou intuídos são menosprezados, não recebem a credibilidade e a atenção que merecem. É o que mostra o filme Vermelho como o céu, produção italiana que recebeu o Prêmio do Público da 30ª Mostra de Cinema de São Paulo (2006) e que foi exibido recentemente no programa Mostra Internacional de Cinema, da TV Cultura.
A história trata de um menino que perde a visão em um acidente e é enviado a uma escola para cegos. Sua sina é cruel: deve aprender a perceber o mundo por meio dos outros sentidos que lhe restam.
Em um de seus momentos mais sensíveis, o protagonista tenta explicar a experiência das cores a um colega, cego de nascença. "O azul? É como o vento que toca o rosto quando a gente anda de bicicleta. O marrom é rugoso como a casca de uma árvore. O vermelho é quente como o fogo, como o céu ao pôr-do-sol".
Assisti àquilo e tentei me colocar em seu lugar. Como eu explicaria as cores, como poderia traduzi-las em outros sentidos?
Percebi que, mesmo lidando com elas há décadas, mal consigo descrevê-las sem recorrer a referências visuais.
Talvez meus outros sentidos estejam cegos para o mundo. Talvez eu não saiba o que as cores são de verdade. Talvez eu saiba apenas o que elas parecem ser. Não há profundidade, não há sentimento. Minhas cores são superficiais. Minha apreensão das coisas é parcial.
O filme Vermelho como o céu me mostrou que sou cego e não sabia.